quarta-feira, 19 de novembro de 2008

A universidade contra a pobreza: qual o papel do curso de direito?

"É impossível erradicar a pobreza em um país sem o apoio direto de sua inteligência, que, normalmente se situa, sobretudo, dentro da universidade. Mas a universidade brasileira tem sido um dos instrumentos de exclusão social, ao se manter alienada do esforço direto de eliminação da pobreza no país. Seus cursos são voltados para atender aos próprios desejos intelectuais dos seus professores e aos desejos de ascensão social dos alunos, orientados para o mercado de trabalho da parte incluída da população brasileira, ignorando os pobres.

Com raras exceções, os cursos de Nutrição se dedicam às pesquisas de caráter e interesse puramente acadêmico, ou ensinar aos seus alunos como emagrecer gordos ricos, no lugar de como engordar pobres magros; os de Arquitetura, a fazer casas de luxo para poucos, no lugar de habitações confortáveis para todos; os da Odontologia, a corrigir defeitos na formação dentária dos que têm dentes, no lugar de evitar que os pobres percam os seus; os de Economia, sobretudo, a textos sobre como aumentar a riqueza, no lugar de buscar meios de mobilização dos recursos nacionais para eliminar os problemas da pobreza.

A luta contra a pobreza exige um apoio à universidade e ao mesmo tempo uma reorientação de grande parte do esforço desta. Para tanto, o governo deve vincular as transferências de recursos públicos às universidades brasileiras ao envolvimento de seus professores, alunos e servidores nos programas de erradicação da pobreza:

a) Na formação e reciclagem dos professores do ensino primário e secundário, a um custo de R$ 27 bilhões ou 2,9% do PIB ou 9% da arrecadação que já foi considerado no programa de educação básica para crianças;

b) No cumprimento de um compromisso da erradicação do analfabetismo de adultos, no prazo de quatro anos, em todo o território nacional, graças à mobilização dos alunos, professores, servidores, com financiamento adicional que será considerado mais adiante, para fins de custos, no programa de alfabetização de adultos, ao custo de R$ 800 milhões ou 0,3% da arrecadação;

c) Reorganização de alguns de seus cursos de maneira a participarem diretamente do entendimento e formulação das técnicas necessárias para erradicar a pobreza, a saber:

- Na Economia, é preciso orientar o estudo do crescimento e da riqueza para o estudo da redução da pobreza, o respeito ecológico, a criação de emprego, a valorização dos aspectos sociais, como educação e saúde;

- Na Saúde, é preciso orientar os alunos nos setores de saúde pública, para programas como Saúde em Casa ou Saúde da Família;

- Na Arquitetura, devem-se concentrar esforços nas técnicas de construções populares, confortáveis e construídas pela própria população interessada;

- Na Nutrição, o estudo deve ser mais para descobrir como eliminar a desnutrição dos pobres do que como diminuir a obesidade dos ricos;

- Os cursos de Ciências devem dar mais importância às licenciaturas;

- As áreas da Pedagogia devem adquirir uma especial nobreza".

(BUARQUE, Cristóvam. A Segunda Abolição. 1. Ed. São Paulo: Editora Paz e Terra, 1999. 87p).

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